Lei Maria da Penha faz 19 anos, mas violência contra mulheres segue alta. Especialistas pedem políticas públicas eficazes
Legislação avançada, realidade violenta
A Lei Maria da Penha, considerada referência internacional no enfrentamento à violência doméstica, completa 19 anos nesta quinta-feira (7). Criada em 2006, ela representou um marco no combate à violência contra a mulher no Brasil. No entanto, os dados mais recentes revelam que o número de casos de agressão e feminicídio segue alarmante. O último Anuário de Segurança Pública mostra que o país registra, em média, quatro feminicídios por dia. São mais de dez tentativas de assassinato contra mulheres diariamente.
Em 80% dos casos, o agressor é o companheiro ou ex-companheiro da vítima. Mesmo com medidas protetivas em vigor, muitas mulheres continuam morrendo. Em dois anos, 121 feminicídios ocorreram mesmo com a vítima sob proteção judicial. Especialistas defendem que a lei é essencial, mas sozinha não basta. A violência permanece e exige políticas públicas efetivas, investimento e atuação integrada do Estado.
Medidas protetivas esbarram na falta de estrutura
As medidas protetivas de urgência são uma das principais ferramentas da Lei Maria da Penha. Em 2024, mais de 555 mil medidas foram concedidas. No entanto, 101 mil dessas ordens judiciais foram descumpridas pelos agressores. A pesquisadora Isabella Matosinhos, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, afirma que a eficácia dessas medidas depende da estrutura que o Estado oferece. Muitas vítimas não têm acompanhamento, e a fiscalização é falha. Além disso, os dados podem estar subnotificados, já que nem todos os estados informam os casos.
A lei prevê uma rede de atendimento com saúde, assistência social e segurança pública. Mas na prática, essa articulação é frágil, especialmente no interior do país. A cada dois minutos, o Brasil recebe uma ligação relacionada à violência doméstica. A falta de prevenção e acolhimento contínuo agrava o risco das mulheres. Especialistas alertam que sem estrutura adequada, medidas protetivas perdem força e podem se tornar apenas um papel assinado.
Políticas públicas
A pesquisadora Amanda Lagreca, da UFMG, defende que o problema exige uma resposta institucional articulada e contínua. Ela destaca que a violência contra mulheres é estrutural e atravessa todas as classes sociais. Porém, 63,6% das vítimas são mulheres negras, e 70,5% têm entre 18 e 44 anos. Isso mostra que a desigualdade racial e econômica acentua o risco de violência. A atualização da lei para reconhecer a violência psicológica foi um avanço importante.
Ainda assim, o foco precisa se expandir para políticas de prevenção, educação e mudança cultural. Grupos reflexivos com agressores, campanhas em escolas e fortalecimento de redes locais são ações fundamentais. A criação do Painel de Dados do Ligue 180 é um passo em direção à transparência e monitoramento. Mas ainda falta investimento. A Lei Maria da Penha foi reconhecida pela ONU como uma das mais completas do mundo. Para que seu impacto seja real, é preciso sair da teoria e agir de forma integrada e contínua.
Fonte: Agência Brasil